Apesar da reconsideração que felizmente se vem marcando com
a passagem do tempo, penso sinceramente que não tenha sido feito, pelo menos,
entre os críticos espanhóis, um estudo que valorize a importância como um todo
e, ao mesmo tempo, as semelhanças que geraram este conjunto de filmes surgidos
no âmbito do chamado free cinema
inglês. Mas além de aí se implicar o florescimento de dois diretores, a meu
ver, de nível elevado como foram Karel Reisz e Tony Richardson, uma geração de
grandes artistas – alguns dos quais continuam exercendo prestígio ilibado,
penso mesmo que sobre esta nova corrente cinematográfica da Inglaterra –
descendeu dos "novos cinemas" europeus, descendência esta que é especialmente
literária. Sem querer lograr mérito aos autores por muitos de seus títulos mais
prestigiados, creio ser evidente que dramaturgos como Allan Sillitoe, John
Braine, John Osborne, Shelagh Delaney e outros, ajudaram a estabelecer um novo
marco em que predominaram os exteriores lúgubres e industriais do país – algo que
de outra forma já estava presente em épocas anteriores do cinema britânico –
personagens cinzentos, alienados e frustrados, um enorme poder descritivo e,
basicamente, o uso de fontes que devem ser consideradas como de grandes
virtudes do cinema britânico em sua história: a existência deste
"realismo" que sempre acompanhou – de forma mais ou menos rigorosa,
mais ou menos apoiada no humor ou em outros gêneros – o futuro da tradição
fílmica de um país que sempre teve uma enorme fraqueza – e alegro-me ao ver todos
os dias que há mais fãs mostrando esta admiração, quando anos atrás parecia que
não era "bem visto" falar bem do cinema inglês.
Dito isso, insisto no fato de que ainda há muitos títulos
imersos nesta corrente – e talvez no cinema britânico dos anos 60 em geral –
que apenas são conhecidos... e o pior que pode acontecer a um filme que atesta
qualidades: não são vistos, de fato. Nunca me cansarei de apelar para a
necessidade de redescoberta a uma das obras que é ápice do free cinema – curiosamente realizada por seu intérprete mais
carismático e, anos depois, quando a corrente já se encontrava abandonada.
Refiro-me a Charlie Bubbles (1968,
Albert Finney). Mas, ao mesmo tempo em que este exemplo concreto – que considero
quase insultante – oferece-nos a chance de desfrutar de títulos apenas
conhecidos em nossa área, e que embora possam parecer imitativos de obras mais
importantes do movimento, não é menos verdade que, uma vez contemplados, revelem
qualidades consideráveis que os fazem dignos de serem situados à altura de
vários dos seus expoentes mais populares e consensuais.
Este é, a meu ver, o caso com The Leather Boys (1963, Sidney J. Furie) – nunca lançado na
Espanha, embora exibido na televisão com o título literal Os Rapazes de Couro. É, sem dúvida, um pequeno filme que bebe
consideravelmente – mais adiante voltaremos a este aspecto – de outros títulos com
significado especial naqueles anos intensos do cinema inglês; mas é certo que,
com voz calma, este filme na trajetória inicial do canadense Sidney J. Furie –
pouco antes de seu enorme sucesso com Ipcress
(1965) e superando um declínio constante e progressivo que chega aos nossos
dias – consegue oferecer uma história sincera, baseada em uma novela do próprio
roteirista do filme – Gillian Freeman –, que destaca claramente a introdução de
uma estranha relação entre os três personagens principais, onde se incorporam
claras notas homossexuais em prolongamento ao mundo dos "motociclistas"
que agrupavam gangues juvenis naqueles anos. E é neste aspecto particular que
devemos destacar a enorme diferença oferecida por este filme, em suas propostas
mitificadas – precedidas significativamente pelo medíocre Salvage! (1954, Laszlo Benedek).
Mas, além disso, The
Leather Boys destaca uma cuidadosa descrição de personagens, centrada no
trio que protagoniza suas imagens. Estes são especialmente Reggie (Colin
Campbell), um mecânico jovem e atraente caracterizado pela imaturidade e
honestidade, que compartilha seu tempo livre na companhia de outros
motociclistas. Reggie é noivo de Dot (Rita Tushigham), com quem logo se casa, estando
ambos com muito pouca idade. Ela é uma mulher bastante ociosa e excêntrica, que
rapidamente percebe seu despreparo para enfrentar uma relação selada como um
casamento. É neste processo, no qual as discussões e confrontos, entre os dois
cônjuges jovens, tornam-se algo prematuramente habitual, em que a figura de
Pete (Dudley Sutton) aparece. Pete é um estranho jovem caracterizado pela sensibilidade
diferenciada e capacidade de reflexão, que logo irá estreitar suas relações com
o desorientado Reggie, para formar uma amizade profunda. Ambos chegam mesmo a
viver e dormir juntos, na casa da avó do jovem marido, quando ela fica viúva; e
para Dot, a presença de Pete sempre será um impedimento para o retorno de seu
marido. O amigo é uma enorme influência sobre Reggie e começa a persuadi-lo a intensificar
na prática do amor pelas motocicletas, participando de novas corridas,
encorajando-o a usar um uniforme completo de couro e abertamente aconselhando-o
contrariamente a retornar com sua esposa. Obviamente, esse comportamento é
devido tanto a uma atitude sincera da psicologia de Pete – evidentemente um
homem experiente – e o desejo homossexual secreto que ele mantém por Reggie e
que o jovem apenas muito depois começa a intuir.
É nesta circunstância que se encontra um dos maiores acertos
em The Leather Boys, simplesmente
saber, em todos os momentos, manter a ambiguidade de seus personagens principais.
É esta dualidade que nos permite conhecer todos os seus pontos fortes e fracos,
e nos permite simpatizar com Dot, apesar de em muitos momentos ela ser uma
jovem caracterizada como ordinária – como quando ela tinge o cabelo com um
estridente loiro – já que no último terço do filme a vemos em seu carinho que
sente por Reggie. De seu lado, no marido podemos encontrar traços machistas –
como quando ele exige que Dot o sirva como uma boa esposa, de maneira
reacionária – mas a verdade é que em sua própria imaturidade se adivinha uma
honestidade que, mesmo inconscientemente, leva-o a ser admirado por esse novo
amigo que o rodeia em todos os momentos. Finalmente, essa ambiguidade tem outra
figura importante no personagem de Pete, que tenta por todos os meios deixar em
segundo plano a sua homossexualidade latente para manter uma amizade em que ele
acredita, e por estar convencido de que ajudará o jovem desorientado com que
vive e compartilha a vida cotidiana.
Será precisamente no plano final – maravilhoso – em que o
tema musical terá um papel maior, envolvendo a despedida emocionante de Reggie,
frustrado em todos os seus sonhos, por ver como sua mulher é infiel quando ele
decide voltar a viver com ela, assim como descobrir que esse amigo, a quem
admira, também vive em uma condição de homossexualidade a qual ele não
compartilha. Este longo plano é re-significado no afastamento que a triste
ponte londrina causa entre os amigos, certamente um toque final brilhante para
um filme que apenas se excede em alguns momentos de competição entre as motocicletas,
especialmente em Edimburgo.
Antes observava as influências que The Leather Boys mantém para com outros títulos britânicos famosos
da época. Sem muita ousadia, cabe notar A
Taste of Honey (1962, Tony Richardson), The
Servant (1963, Joseph Losey), Billy
Liar (1962, John Schlesinger) e alguns outros. Apesar dessa influência –
pois ninguém se opõe quando um filme de cinema noir se parece com outro sucesso precedente – encontramos um filme
brilhante, emotivo e de momentos magníficos em que é impossível parar de destacar
o trabalho de um elenco que não parece interpretar, pois com atores que parecem
ser eles mesmos seus próprios personagens. E, entre eles, eu gostaria de
destacar o trabalho do jovem e inseguro Reggie, desempenhado por Colin Campbell
que, surpreendentemente, não continuou no cinema inglês de seu tempo. Seu trabalho
é realmente uma maravilha de espontaneidade e sensibilidade, dentro de um filme
que merece realmente sair de seu imerecido anonimato.
Juan Carlos Vizcaino
*** traduzido do blog do autor
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